2005-12-18

Em Missão

Caro amigo,

Faltam poucos dias para celebrarmos o nascimento do nosso Salvador. Nesta sociedade materialista que trocou o Menino Jesus pelo Pai-Natal, a proximidade do Natal significa, em geral, ir às comprar. As ruas da cidade, as lojas comerciais enchem-se nesta época de pessoas que avidamente procuram novos produtos que possam surpreender. Preparam-se refeições, enfeitam-se as casas, dependuram-se nas janelas ou nas chaminés bonecos vestidos de vermelho.... porque é preciso fazer crer que o Pai-Natal existe mesmo.

Será isto Natal?

Nestes dias que antecedem a grande festa, proponho-te, amigo leitor, que percorras outros caminhos, que os teus dias seja diferentes daqueles que vêm no Natal apenas mais uma festa anual como outras tantas. Olha para dentro de ti, examina o teu coração e expulsa dele tudo o que te separa de Deus e dos irmãos: a arrogância, o ódio, a inveja, o ressentimento, a vaidade, etc... Prepara o teu coração para que Jesus possa nascer nele. Como Maria, a mãe de Jesus, diz SIM ao projecto de Deus. Deixa-te fecundar pelo Seu Espírito.

Se assumires esta missão, serás, onde vives, sinal da Presença de Deus. A tua vida se transformará e, através ela, também se poderão transformar as vidas dos irmãos que vivem contigo. Não tenhas medo! Onde quer que estejas – na tua família, na tua comunidade, no hospital, na cadeia, etc. – vive este tempo como tempo de Missão para acolheres Aquele que nasceu para nos salvar.


David

2005-12-14

S. João da Cruz

Já que o tempo chegava
Em que fazer-se convinha
O resgate da esposa
Que num duro jugo servia
Sob aquela lei
Que Moisés lhe havia dado,
O Pai com terno amor
De esta maneira, dizia:
- já vês, Filho, que a tua esposa
Feita à tua imagem,
E no que a Ti se parece
Contigo bem convinha;
Mas difere na carne
Que em teu simples ser não havia.
Em amores-perfeitos esta lei se requeria;
Que se faça semelhante
O amante a quem queria;
Que a maior semelhança
Mais deleite continha;
A qual, sem dúvida, como tua esposa
Grandemente crescerá
Se te vir semelhante
Na carne que tinha.

S. João da Cruz, poesia 7

2005-12-04

No deserto

«Uma voz clama no deserto: “preparai o caminho do Senhor...”»

A leitura deste domingo sugere-nos que o deserto é um lugar onde, confrontados com o que realmente somos, nos purificamos para receber o Senhor. O deserto não é uma fuga ao mundo, mas uma forma de estar e de viver no mundo. É o lugar do baptismo de arrependimento que João Baptista continua a oferecer.
Quando assumimos conscientemente essa etapa “purgativa”, na solidão que reclama o encontro com o Deus vivo, longe da confusão estonteante da sociedade, preparamos um caminho para a vinda Deus.
É impossível celebrar o nascimento de Deus sem a experiência prévia da passagem pelo deserto.
Concede-nos, Senhor, a graça da determinação.

David

2005-11-27

ADVENTO

Acredito na vida como um Advento:
Acredito que as árvores que parecem mortas hão-de ressuscitar.
Acredito que o céu cinzento há-de se vestir de novo de azul e o sol voltará a brilhar.
Acredito que aquele que dorme na rua há-de ter um lar e uma família.
Acredito em Deus, num Deus que se fez homem e continua vivo em nós.
Acredito em mim, no poder transformador do Homem, na sua capacidade de construir o Reino de Deus.
Acredito que um dia voltaremos a ser como crianças, que a alegria há-de vencer o medo e que a Vida superará a morte.
Acredito que a Paz é possível e que podemos viver, lado a lado, como irmãos, independentemente da cor, raça ou religião.
Acredito que o Amor pode fazer milagres e que todos os dias podemos amar.
Acredito na vida porque vivo-a como um Advento.

David


2005-11-17

O Pão da Palavra

Depois de uma breve leitura sobre S. Bernardo de Clareval, pareceu-me oportuno deixar uma pequena reflexão deste santo sobre a Sagrada Escritura:
"Por pouco que se possa ajudar as almas que procuram o Senhor com o seu espírito e afecto, deverei responder e satisfazê-las, extraíndo da Sagrada Escritura, da qual estou convencido dimana a vida, algo decisivo e espiritual, para que comam os desvalidos até ficarem saciados e vivam seus corações".
Num tempo com variados caminhos que nos chamam para aí alimentarmos o nosso coração, deixo aqui estas palavras, muito a propósito, sobre um alimento diário: ao levantar, a meio e a final do dia. Vamos ruminar a Palavra de Deus e concretizá-la ao longo do nosso dia no contacto com os outros!

Crisóstomo

2005-11-13

Teresinha do Menino Jesus e os talentos na Igreja

A parábola dos talentos recorda-me que, como baptizado, tenho responsabilidades no seio da Igreja que devem ser assumidas. Deus confiou-me alguns os Seus bens, alguns talentos, para que os faça render em favor de todos os irmãos.

Ao longo desta semana, em Lisboa, durante o Congresso Internacional para a Nova Evangelização, as relíquias de Santa Teresinha do Menino Jesus estiveram na Sé para serem veneradas pelos fiéis. Santa Teresinha, a jovem Carmelita, aquela que apesar de nunca ter saído do convento, tornou-se a Santa dos Missionários, no seu processo de discernimento vocacional escreve:

«Considerando o corpo místico da Igreja, (...) entendi que só o Amor faz os membros da Igreja agir, e que se o amor viesse a faltar, os apóstolos não anunciariam o Evangelho, os mártires não derramariam o seu sangue. Compreendi que o Amor encerra todas as vocações, que o Amor é tudo. Que ele inclui todos os tempos e lugares. Então, no excesso da minha alegria gritei: Ó Jesus, meu amor, encontrei finalmente a minha vocação... A minha vocação é o Amor. No coração da Igreja, minha Mãe, eu serei o Amor»

Ela fez render os talentos que Deus lhe confiou. Que grande exemplo nos deixou...

David

2005-11-01

Procuram-se santos

A santidade não está na moda. Se fizéssemos uma sondagem aos transeuntes das ruas da nossa cidade, vila ou aldeia e se lhes perguntássemos pelos seus desejos mais prementes, ouviríamos respostas deste género: «pois, gostava de ter um carro mais rápido, uma casa maior, uma mulher mais bonita, um marido mais assim ou assado» e por aí adiante. Mesmo entre nós, cristãos praticantes, julgo que as respostas são seriam muito diferentes.

Infelizmente, parece-me que a santidade não faz parte dos nossos bens desejados, nem está na lista dos nossos objectivos pessoais, nem entra nos nossos sonhos. É algo de outros tempos... Porquê? Talvez porque a julgamos fora do nosso alcance; talvez por medo do que os outros possam dizer a nosso respeito se trabalharmos diariamente para que esse ideal se torne real em nós; talvez porque é mais cómodo viver sem essas inquietações.

Mas a nossa vida de baptizados sem o desejo de viver em santidade será semelhante à de tantos irmãos que desconhecem a mensagem de Jesus. E a Igreja precisa, como a terra árida precisa de água, de novos santos, novas referência, novos modelos que actualizem a mensagem de Jesus neste mundo.
Queres ser santo?



David


2005-10-24

Quanto tempo o tempo tem...

"Os sonhos de Einstein" trata-se de uma peça de teatro que teve a sua estreia no passado sábado, dia 22 de Outubro, no Trindade. Os excelentes actores, o humor, a música e, sobretudo, o canto de vozes extraordinárias, proporcionaram-nos um grande espetáculo e uma tarde bem passada; sem dúvida, a melhor peça que assisti, mas este facto não deve ser tido em conta visto que foi apenas a segunda vez que fui ao teatro. Mas vale mesmo a pena ver... São quase duas horas de espetáculo em que nos é representada a vida de Einstein à volta da sua famosa teoria da relatividade, o tempo e os seus sonhos com a sua misteriosa amada. Isto chega para abrir o apetite; o melhor é mesmo ver a peça, que fica a ganhar muito pela música e canto. Fica a sugestão para quem quiser passar um bom bocado...
E já agora: "Quanto tempo são seis segundos?" É com esta pergunta que começa a peça... pensem na resposta...
Para mais pormenores pode consultar a página web www.teatrotrindade.inatel.pt
João

(IR)RESPONSABILIDADE SOCIAL…


No último sábado, dia 22, regressei aos Bairros 6 de Maio e Estrela de África (Amadora), na minha actividade de Pastoral. Fui participar na reunião de um dos grupos de missão que acompanho (“No djunta mon”), um grupo de guineenses.
A reunião correu muito bem e foi bom voltar a estar com aquela gente tão simples mas tão sedenta da Palavra de Deus como de atenção.
Antes da reunião, guiado por duas Irmãs dominicanas do Rosário, que aí têm uma comunidade, visitei uma das zonas que foram destruídas devido aos planos de realojamento.

Fiquei escandalizado!
Bem ou mal, retiraram as pessoas dessa zona.
Bem ou mal, levaram-nas para novos alojamentos.
Nada bem e muito mal, destruíram as barracas dessa zona do Bairro e deixaram os escombros no local.
O facto é que aí se reproduzem as ratazanas e outros animais.
Aí estão os canos da água a jorrar (e ainda dizem para pouparmos água…).
Aí andam as crianças do bairro sujeitas a magoar-se ou a ser mordidas pelas ratazanas (o que já aconteceu).

Será que esta gente é menos gente?
Será que o facto de serem pobres imigrantes, muitos deles ilegais, faz deles menos gente?
Será que, porque não são fonte de votos, são menos merecedores de atenção?
(Nem falo da sua cor de pele… prefiro acreditar que esse factor não é significativo…)
Será que a Câmara Municipal da Amadora distingue munícipes de primeira e de segunda?

Há que ser muito irresponsável para nada fazer perante tal situação!!!
Pelos vistos, em algumas zonas, reina a irresponsabilidade social!!!
É o país que temos!!!

MARTYR

2005-10-21

Por uma sociedade melhor

No nosso dia a dia as notícias que nos invadem, em geral, têm a ver com a situação económica do país: suas causas, vivências e possíveis soluções. Trata-se de um tema, digo-o com sinceridade, que já nem consigo ouvir, principalmente as mentes brilhantes que o comentam: “falam, falam, falam e não fazem nada…” Como problema central na sociedade hodierna, ele arrasta consigo muitos outros problemas que acabam por degenerar a sociedade… Mas não vou entrar por aí!
Ao passar os rápidos olhos pelo jornal diário, houve uma pequena notícia, relegada para as páginas onde fica a virtude, que li, reli, meditei e decidi partilhar. Trata-se da ACEGE(Associação cristã dos empresários e gestores) que decidiram elaborar um CÓDIGO DE ÉTICA, onde todos os membros são convidados a assinar, a título pessoal, um código onde prometem, por exemplo, “lutar contra todas as situações de fraude, pela justa remuneração dos seus colaboradores, pelo combate à evasão fiscal e à fraude”… e podia continuar a enumerar aqui os traços deste CÓDIGO DE ÉTICA.
Contudo o importante deste gesto, na minha humilde opinião, é, sem dúvida, a iniciativa deste grupo da sociedade (empresários) que assumem valores, não só cristãos, mas que são de toda a sociedade. São pequenos gestos que o cristianismo, ano após ano, século após século, vem apregoando aos ouvidos da sociedade e que não são apenas para aqueles que vivem como baptizados, mas para toda a sociedade.
E se todos nós, cristãos, assumíssemos as nossas raízes morais e éticas? A sociedade não viveria melhor? Certamente este problema é de todos, mas não é a sociedade portuguesa ainda maioritariamente cristã? E se fossemos os vanguardistas nesta matéria, tal como este grupo e outros que vivem ofuscados pela luz do consumismo e do individualismo?
Espero também não ser daqueles que
falam, falam!!…

Crisóstomo

2005-10-17

Alice

Alice é um filme (até parece um reportagem alargada, mas sem comentários) de Marco Martins que conta a história de um casal cuja a filha, Alice, desaparece sem deixar sinal.

A mãe da desaparecida vive como uma alma penada num purgatório que a castiga por um pecado nunca cometido; o pai – um sujeito sempre vestido de preto, de olhos fundos e escuros, cabelo e barba como as noites mais escuras, tudo negro como que a indicar o estado de espírito em que vive – cumpre diariamente uma série de rituais na esperança de descobrir Alice. Grande parte do filme revela a obsessão do pai que procura desesperadamente a sua filha entre as milhares de pessoas anónimas que todos os dias percorrem a cidade de Lisboa.

Alice terá sido o filme com menos palavras que vi nos dias da minha vida. Pobre nas palavras e nas cores, lento nas sequências, mas rico em imagens e na forma de transmitir uma mensagem. Uma pobreza que é riqueza porque meio deliberadamente escolhido para dizer o que não pode ser dito por meio de palavras, mas através de expressões corporais, sobretudo do olhar e das cores das manhãs frias e cinzentas.

A banda sonora do filme também é pobre: só de tempos a tempos ouvimos um clarinete acompanhado por um piano que amplifica as dores do casal, que revela ao ouvinte o estado de «transe» em que eles se encontram.

Em Alice o espectador é contagiado pelo drama do casal. Um drama infelizmente bastante real na nosso mundo. É também contagiado pela beleza da cidade de Lisboa.
O cinema português está de parabéns!

David

2005-10-16

Dar a César... e a Deus o que Lhe pertence.

A frase de Jesus «entregai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus» (Mt 22,21) é, provavelmente, uma das mais conhecidas e citadas dos Evangelhos. Há bem pouco tempo, a propósito de um comentário a esta frase, uma boa senhora protestava contra o padre dizendo que «não lhe ficava bem falar desse assunto na Igreja». Para esta senhora, o padre deveria falar apenas de temas espirituais, de assuntos do outro mundo e nos modos de lá chegar e não nos incómodos problemas da realidade, nem nas jogadas que os homens fazem para não cumprirem as suas obrigações em relação ao Estado.

É verdade que esse assunto – isto é, o dever de dar a César, de pagar impostos - nunca despertou grande entusiasmo, nem mesmo entre nós, os crentes. Mas a afirmação de Jesus é clara: eu devo restituir aos Césares deste mundo aquilo lhes pertence. Actuar de outra forma é desonesto e imoral.

Mas mais ainda, devo entregar a Deus o que é d’Ele: como ser criado à Sua imagem e semelhança, o homem pertence a Deus. Entre outros aspectos, esta afirmação recorda-nos que quando nos servimos dos outros como objectos para alcançar os nossos fins, estamos a desrespeitar a obra de Deus. Dominar o homem que por natureza pertence a Deus, escravizar o irmão para proveito pessoal é, deste modo, uma conduta contrária à mensagem divina.


David

2005-10-12

UM ANIVERSÁRIO NA LUZ


Ainda o sol estava com preguiça de sair da cama e a chuva caía sem parar, quando ontem, nesta comunidade, um coro de «angelicais» vozes começou a louvar o Criador… o motivo desse acontecimento, como todos os dias, era o agradecimento pelo dom da vida e sua entrega nas mãos do seu Senhor nesse novo dia que começa, mas ontem havia um motivo especial… um de nós comemorava os 32 anos da sua peregrinação por estas paragens… era o (ontem menino) Nélio! Assim, em comunidade de alegria e fé, celebrámos a Eucaristia de louvor por esse dom para ele, para a sua família, para esta comunidade, para a CM, para a Igreja e para a humanidade.

Embora privados da sua presença na primeira refeição do dia (sim, porque o homem é um desportista!!!), avançámos para a normalidade das nossas actividades diárias, em ansiosa esperança do lauto e farto banquete que à noite nos esperava…

Recebidos os amigos, sempre bem vindos, rezadas as vésperas, começámos o banquete nupcial, embora desta vez sem noiva, e fomos regalando as nossas almas com a companhia e os nossos corpos com as iguarias…

Foi um dia especial… mas também não é todos os dias que se tem motivo semelhante!!!

MARTYR

NOTA – Esta não é nem pretende ser uma crónica… é só uma visão pessoal dos acontecimentos… até porque para cronista designou-se outro… que o seu papel desempenhará com distinção (ver Noticias)…

2005-10-09

Reino de Deus é como um banquete nupcial



A comparação do Reino de Deus com um banquete nupcial não terá surgido por mero acaso no diálogo de Jesus com os homens religiosos do seu tempo. Jesus não compara o Reino de Deus com um templo religioso, uma sinagoga, um lugar de oração, mas sim com um «tempo de festa», um lugar de fartura de comida e bebida, de encontro com os entes queridos, de música e dança, lugar da celebração festiva.
O rei que prepara a festa de casamento do seu filho, diz-nos Jesus no Evangelho de hoje, não obriga ninguém a participar, mas apenas convida. Deixa a cada um de nós, convidados, essa possibilidade de escolhermos entre fazermos festa com Ele ou ficarmos à margem, indiferentes.
Deus convida-nos cada dia que passa a essa intimidade festiva com Ele. Quando, livremente, aceitamos participar nesse banquete, podemos também dizer como S. Paulo dizia aos cristãos de Filipos quando se encontrava preso: «tudo posso por Cristo, que me dá força». A esse Deus que nos faz viver em contínua festa, «Glória pelos tempos sem fim. Ámen.»
David

2005-07-16

Desafio...

«Unido a todos os homens
que lutam por um mundo melhor
quero agradecer-te, Senhor,
a vida que pusestes em minhas mãos,
com tudo o que ela tem
de belo... de procura... de aventura... de risco!
Aceita tudo o que de melhor
começa a despontar em mim,
e que ainda nem conheço bem:
as forças novas e a alegria de viver...
os projectos e as decisões,
a vontade de trabalhar e lutar...
desejo de conhecer e amar...
a inquietação de procurar e conseguir...
a preocupação de servir e partilhar...
Que nada fique estéril em mim,
mas que tudo floresça e dê fruto!
Protege-me, Senhor,
nas incertezas e inseguranças da minha idade.
Defende-me do medo
que atrofia e não deixa fazer opções;
do farisaísmo que alimenta preconceitos
e defende a mentira;
da rotina que mecaniza e destrói as pessoas.
E que pelos meus esforços,
simples mas generosos,
eu me dedique inteiramente ao Teu serviço
e ao dos homens meus irmãos!»
(?)

2005-06-27

“FELIZES SEREIS VÓS QUANDO...”

Felizes os que sabem rir de si próprios: nunca deixarão de se divertir.
Felizes os que sabem distinguir uma montanha de um grão de areia: evitarão muitos aborrecimentos.
Felizes os que não se vangloriam para não se levarem muito a sério:
serão estimados pelos os que os rodeiam.
Felizes os que sabem olhar com seriedade para as pequenas coisas, e com a paz para as coisas importantes: chegarão longe na vida.
Felizes os que sabem admirar um sorriso e esquecer uma afronta: no seu caminho haverá sempre sol.
Felizes os que pensam antes de agir, e os que rezam antes de pensar: evitarão muitas asneiras.
Felizes os que sabem calar e sorrir mesmo quando lhes tiram a palavra, os contradizem e amesquinham: o Evangelho começa a penetrar no seu coração

2005-06-13

«Dai-lhes Senhor o Eterno descanso...»

Na madrugada deste dia 13 de Junho, festa de Santo António, Portugal veste-se de luto pela morte de duas ilustres figuras que marcaram o história portuguesa na segunda metade do século XX: Álvaro Cunhal e Eugénio de Andrade.

Álvaro Cunhal

É digna de memória a postura coerente e corajosa do ex-dirigente do PCP português, Álvaro Cunhal. Homem inteligente e dotado, Álvaro Cunhal destacou-se fundamentalmente pela sua luta antifascista. As teses por ele defendidas (o comunismo na sua essências) não são muito diferentes daquilo que a Igreja defende. Contudo, os meios para alcançar esses fins – maior justiça social, a promoção das classes desfavorecidas – diferem substancialmente.

Eugénio de Andrade

AS GAIVOTAS

«As gaivotas. Vão e vêm. Entram
Pela pupila.
Por fim o mar.
Não tardará a fadiga da alma.
De tanto olhar, tanto
Olhar. »

Eugénio de Andrade é um dos poetas mais lidos e apreciados quer em Portugal, quer no estrangeiro. Deixa-nos uma obra imensa...

«Dai-lhes Senhor o Eterno descanso...»

David

2005-06-10

ouve amigo...

A propósito do fim de semana prolongado, do sol, do cheiro a férias que se torna cada vez mais intenso... lembrei-me de te dizer, como outrora disse o Poeta Júlio Roberto:

«Ouve meu amigo,
não penses que a vida é apenas lutar
e sofrer para sobreviver.

A vida é também ser,
é sobretudo amar, sorrir,
cheirar uma flor,
ter algures um grande amor.

Correr pelos prados com uma canção na boca
e uma estrela no olhar.
Ouvir os pássaros a cantar
e gostar dos grilos a conversar.

A vida é também parar
escutar o som do vento
ver a espuma do mar.

Ter a mão nos cabelos de qualquer amor.

Fazer festas a uma criança
abrir a boca e dizer: Ah!,
são os foguetes que vão no ar.

A vida é tudo e nada.

E a alma da gente é como um lago
com cisnes e nenúfares,
e é também cantar para ti
esta canção de embalar.

Não te percas,
não sejas sério demais
não te deixes apanhar.

Anda, vem comigo,
vamos ver as conchas do mar...»

Bom fim de semana,

David

2005-05-24

Fracasso

Quanto supus ser vitória é fumo apenas.

Fracasso, linguagem do fundo, pista de outro espaço mais exigente, difícil de entreler é tua letra.

Quando punhas tua marca em minha fronte, nunca pensei na
mensagem que trazias, mais preciosa que todos os triunfos.
Teu rosto chamejante perseguiu-me e eu não soube que era para salvar-me
Para meu bem desterraste-me para lugares recônditos, negaste-me
êxitos fáceis, cortaste-me saídas.
Era a mim que querias defender ao não me conceder brilho.
De puro amor por mim manejaste o vazio que tantas noites me fez
falar febril a uma ausente.
Para proteger-me deixaste passar outros, fizeste que uma mulher prefira alguém mais ousado, afastaste-me de ofícios suicidas.

Vieste sempre dar a cara.

Sim, teu corpo chagado, cuspido, odioso, recebeu-me na minha
mais pura forma para me entregar à nitidez do deserto.
Por loucura amaldiçoei-te, maltratei-te, blasfemei contra ti.

Tu não existes.
Foste inventando pela soberba delirante.

Quanto te devo!
Levantaste-me a um novo nível limpando-me com uma áspera
esponja, lançando-me para o meu verdadeiro campo de bata-lha,
cedendo-me as armas que o triunfo abandona.

Levaste-me pela mão à única água que me reflecte.
Por ti não conheço a angústia de representar um papel, manter-me
à força num alto, trepar com esforços próprios, discutir
por causa de hierarquias, inchar até rebentar.
Fizeste-me humilde, silencioso e rebelde.
Não te canto pelo que és, mas pelo que não me deixaste ser. Por
não me dares outra vida. Por me teres diminuído.

Ofereceste-me somente nudez.
É verdade que me ensinaste com dureza e tu mesmo trazias o cautério!,
mas também me deste a alegria de não te recear.
Obrigado por me tirares espessura em troca de uma letra grande.

Obrigado a ti, que me privaste de vaidades.
Obrigado pela riqueza a que me obrigaste.
Obrigado por me construir com meu barro a minha morada.
Obrigado por me afastares.
Obrigado.

(Rafael Cadenas)

2005-05-12

A Mão no Arado

Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs de verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua

É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte
É triste no Outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gente com que
montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos do amanhã

Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de Novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
a atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente
(Ruy Belo)

2005-05-08

Ascensão e Missão

Trinta e três anos após a sua descida à terra, Jesus sob aos céus e entra de novo em casa. O anjo Gabriel ao vê-lO passar surpreende-se por tão inesperada chegada. Trinta e três anos não era o tempo suficiente para Jesus cumprir com a importante tarefa de lançar os fundamentos do Reino de Deus.
«Já de volta?» disse o anjo a Jesus.
«Bem... Eu gostaria de ter ficado por mais uns tempos, mas eles condenaram-me à morte e crucificaram-me», respondeu-lhe Jesus.
«Oh! Crucificaram-te?!», disse o anjo, «então isso significa que fracassastes...»
«Não necessariamente», acrescentou Jesus. «Sabes, Eu chamei e congreguei um pequeno grupo de discípulos. Eles irão agora prosseguir a minha missão».
«E se eles falharem?» perguntou o anjo.
«Eu não pensei nisso... não tenho outros planos. Eu confio neles...»

Já pensastes nessa missão que como discípulo estás chamado a realizar?

(David)

2005-04-28

A IGREJA É A MINHA CASA

A propósito da eleição do Papa Bento XVI e de algumas reacções menos «católicas» mesmo no seio da Igreja, lembrei-me do que há uns anos atrás escrevia o bispo de Setúbal, D. Manuel Martins. O Texto é, certamente, conhecido, mas deixo-o neste espaço... (David)

Sim, é a minha casa,
Esta Igreja onde eu nasci e quero morrer...
Nela me sinto bem. Nela gosto de estar!
Aqui, eu penso, projecto, sonho, alimento-me...
Aqui, rezo, recordo, choro, zango-me, encontro-me...
Aqui sofro... aqui canto...
A Igreja é a minha casa
Gostaria, tantas vezes, de a ver
Mais acolhedora...
Mais aberta...
Com mais espaços para pessoas outras
(não é ela comunhão e sacramento?),
Mais gratuita...
Mais convidativa...

A Igreja é a minha casa
E tenho pena que, às vezes,
Feche portas,
Condene sem coração,
Corte com quem procura...
Eu amo muito a Igreja... porque
A Igreja é a minha casa...
Com defeitos?
Com a ruga dos anos?
Às vezes azeda?...
Então, porque lhe quero muito,
Vou pintá-la de fresco,
Vou rasgar-lhe mais portas,
Vou torná-la mais simpática,
Mais disponível,
Mais atenta...
Vou fazer com que cante mais a beleza da vida,
Perca o medo e salte para o mundo,
Grite os valores e os direitos das pessoas e dos povos...

A Igreja é a minha casa
Se eu quiser...
Se tu quiseres....
Se nós todos quisermos...
Todos virão a ela
E todos nela se sentirão bem...
Porque ela é o rosto de Deus,
Porque Deus habita nela...
D. Manuel Martins

2005-04-03

João Paulo II

Quem tem menos de 30 anos, não conheceu na vida outro Papa ao não ser João Paulo II. A Igreja em tempo de grande festa, a Páscoa, veste-se de luto para o último adeus àquele que foi um líder espiritual próximo de todos, àquele que fez da sua vida um exemplo e um defensor de toda a vida.

Ao Deus que «nos fez renascer para uma esperança viva» (1 Pd 1,3), pedimos a graça de conservar o seu exemplo. Que o Espírito Santo ilumine a Igreja nesta fase de transição; que o novo Papa seja um homem capaz de ler o sinais dos tempos e de ser o principal protagonista, como foi João Paulo II, na construção do Reino de Deus neste mundo

David

2005-03-26

Festa

Era...
Era eu!...
Débil e ténue
De mãos recostadas
No conforto inconsolável
Dos perfumes mudos de dor...

Eras...
Eras Tu!...
Que descias nas cascatas
Das minhas lágrimas
Que galgavam como lanças
Em dias de combate...

Era...
Era eu!...
Fortaleza em ruínas
Sentinela do vazio
Gemido balbuciante que fervilha
“ Levaram o meu Senhor...”

Eras...
Eras Tu!...
Na neblina da minha procura
No milagre do amor
No coração festivo
Que a vida celebrou... “Mestre”.

Era... Era o silêncio efémero do sepulcro
Num hino retumbante de Vitória.

Joao Luís Silva CM

Homilia de Sexta -Feira Santa

Meus queridos irmãos e irmãs
Estamos aqui reunidos, unicamente porque o amor de Deus nos une e reúne, neste mistério que hoje celebramos que é a paixão e a morte do Senhor Jesus. Por isso mesmo só o silêncio orante de quem reza faz sentido.
É perante a cruz do Filho de Deus que descobrimos, quem somos, donde vimos e para onde vamos, a cruz de Cristo diz-nos quanto valemos aos olhos de Deus, e sabemos que valemos tudo.
A leitura do Livro do profeta Isaías que escutamos, fala-nos desse: “rosto desfigurado que tinha perdido a aparência humana, acostumado ao sofrimento”. Fala-nos desse vazio, que é a vida entregue, dentro da qual Deus constrói um mundo novo, vazio de egoísmo e poder para que o amor de Deus possa vir em cheio.
Só assim percebemos, que a cruz de Cristo é para nós sinal da presença amorosa de Deus, é a chave que desvenda e ilumina os mistérios da vida, da nossa vida e do nosso dia-a-dia.
Todos nós já fizemos a experiência do Jardim das Oliveiras, do abandono da solidão. Quantas vezes nos sentimos rejeitados, maltratados e sós.
Quantas vezes clamamos: Porquê Senhor, porquê tenho de sofrer?
Porque amamos e porque Deus nos ama.
“Amar é sofrer e sofrer é Amar”.
Esta a experiência de quem caminha com Jesus e para Jesus, porque Ele próprio deu a vida por nós.
E vós pais e mães de família, bem sabeis como isso é.
Quantas vezes vos rejeitastes para vos dardes aos vossos filhos.
E vós filhos quantas vezes o fizestes pelos a vossos pais já idosos e doentes.
Foi para sofrer?
Não!
Foi por amor, foi para não ver sofrer.
Esta é a mensagem da cruz do Senhor, nela fazemos a experiência de amar e dar a vida, é ai que experimentamos que o: “Seu jugo é suave e a Sua carga é leve”, porque Ele próprio a suporta connosco.
É esta capacidade de ir mais longe de ir até ao fim, como cantávamos no Salmo 22: “Meu Deus meu Deus porque me abandonaste”. Não é sentir-se abandonado por Deus, mas é fazer a experiência de todos os abandonados, que Cristo em Si transformou em Paz e em sinal de vitória.
Meus queridos irmãos e irmãs, pelo Evangelho sabemos que junto de Jesus no Monte Calvário estavam mais dois crucificados (o bom e o mau ladrão). Esses crucificados representam a humanidade inteira, somos nós nesta capacidade de dar a vida ou de a reter.
Percebemos também que ontem como hoje, Jesus nos quer no cimo da montanha e ao Seu lado para nos dar um Reino que é Ele próprio, percebemos ainda que em cada crucificado do mundo está Jesus.
Nesta Sexta-feira Santa meus irmãos o caminho de Jesus é o caminho que se oculta na esperança, e que nos torna peregrinos, é o caminho de Maria, que do caminho do Calvário, fez caminho para o coração de seu filho e para cada um de nós, como Mãe da humanidade.
Este é o nosso caminho, caminho de comunhão e salvação, de evangelização de vida.
Meus queridos amigos mergulhados neste mistério que é a cruz do Senhor só nos resta contemplar e exclamar: “Faz-nos morrer Senhor para que possamos nascer de novo para a vida nova que és Tu.
Celebramos hoje a morte do Senhor Jesus, certamente sentimo-nos comovidos não tanto porque o Filho de Deus morreu, mas sim porque foi por nós e para nós e porque o seu: “Amor permanece para sempre”.



João Luís Silva CM
Igreja de S. Tomás de Aquino – Lisboa

2005-03-24

«Eu dei-vos o exemplo...»

Já amaste?

Porque Deus é amor, quando verdadeiramente amamos participamos no «SER» de Deus e, por isso, estamos dispostos a fazer tudo para promover a pessoa amada.

Já amaste? Se sim, certamente terás experimentado essa força que te leva a fazer coisas loucas, incompreensíveis e inaceitáveis para as pessoas de “bom-senso”.

O Evangelho de hoje, Quinta-feira Santa, descreve-nos a atitude desconcertante de Jesus e a hostil reacção de Pedro. O discípulo compreende que Jesus inverte a lógica estabelecida ao assumir o papel de servo, lavando os pés dos apóstolos. Pedro, como todas as pessoas de «bom-senso», protesta porque não aceita a «lógica do amor». Por palavras e actos Jesus diz-nos que quem ama vai mais longe, supera regras, ultrapassa limites, surpreende a cada momento e tudo é gratuitidade (é o que fazem a maioria das mães por causa de seus filhos...). Ser discípulo de Jesus é fazer do amor regra de vida. O importante é amar. Quanto se ama tudo está bem, como dizia S. Agostinho: «Ama e faz o que quiseres...»

AMAS?

David

2005-03-13

«Lázaro, vem para fora».

Quantas vezes seria necessário libertar o Lázaro que mora em nós?

Todos nós guardamos nos arquivos da nossa memória experiências traumatizantes: mal-entendidos, apreciações injustas, sinais de desprezo por parte de outros, etc... Porque esses traumas nos fazem sofrer, evitamos a convivência com as pessoas que estão associadas a esses momentos. Com o decorrer dos anos, vai aumentado a lista daqueles com os quais nada queremos. Às vezes expressamos esse mal-estar quando dizemos que “aquela pessoa, para mim, já morreu!”

Desta forma, o nosso coração assemelha-se a um cemitério onde todos os dias/semanas, são sepultados novos irmãos. A nossa postura perante o outro, o nosso comportamento, denuncia, tantas vezes inconscientemente, a morte que caminha connosco, os Lázaros “malcheirosos” que nos tornam homens e mulheres amargos/as, ressentidos/as e intolerantes.

No Evangelho de hoje, Jesus diz: «Lázaro, vem para fora». Aquilo que parece impossível torna-se realidade: Lázaro vive de novo. Nestes dias de preparação para a grande festa dos cristãos, a Páscoa, oxalá seja também um tempo de libertação/ressurreição dos Lázaros que permanecem enterrados dentro de nós.

David

2005-03-09

Um Amor à cruz...

Eu me abandono, ó Deus, nas tuas mãos
Modela este barro, como faz o oleiro.
Dá-lhe forma, e depois, se quiseres,
esmigalha-a como foi esmigalhada a vida de João, meu irmão.
Ordena o que queres que eu faça
e o que queres que não faça.
Elogiado e humilhado, perseguido,
incompreendido e caluniado,
consolado, magoado, inútil para tudo,
só me resta dizer, a exemplo de Tua Mãe:
“Faça-se em mim segundo a Tua palavra”.

Dá-me o amor por excelência,
o amor à Cruz.
Não às cruzes heróicas,
que poderiam despertar em mim o amor próprio, a vã glória;
mas o amor às cruzes de cada dia
que se encontram na contradição,
no esquecimento, no fracasso, nos juízos errados e na indiferença,
na rejeição e no menosprezo dos outros,
no mal-estar e na doença,
nas limitações intelectuais,
e na secura, no silêncio do coração.

Só então Tu saberás que Te amo.
E isso me basta.

(Robert Kennedy)

2005-03-07

Construir...

«O Homem só se apercebe, no mundo, daquilo que em si já se encontra; mas precisa do mundo para se aperceber do que se encontra em si; para isso são, porém, necessários actividade e sofrimento».

(Hugo Von HOFMANNSTHAL)

2005-03-01

Oração

Silêncio!
A Tua “hora”
Na hora…
E no mistério orante
Do dealbar eterno
E fulgurante
Do meu lar:
“Filho, eis a Tua Mãe”.

João Luís Silva

2005-02-22

MEDO?

Uns dias antes das eleições legislativas, encontrei algumas pessoas muito ligadas à Igreja que temiam a vitória dos partidos de esquerda, sobretudo se o principal partido, o PS, se aliasse à esquerda radical. Homens e mulheres, inclusive consagrado/as, temiam as reformas laicizantes, as perseguições de um governo liderado por gente sem fé.

A vitoria do PS veio dar mais força à essa onda de temor. Contudo, parece-me que essa não é, nem deve ser, a nossa atitude. Em primeiro lugar porque o medo é paralizante, faz-nos viver na defensiva, como infelizes que esperam a má sorte dos outros. Essa é uma atitude pouco evangélica. Por outro lado, que há a temer? Que nos tirem as casas?, que se apoderem das nossas instituições?, que nos insultem na praça pública? Mas nada disso seria uma novidade, só que esquecemos que seguir Jesus significa desprender-se de tudo, inclusive daquilo que julgamos vital, e predispor-se para subir ao calvário onde seremos, como Jesus, crucificados.

Mais do que temer, é de pedir a Deus que esse tempo chegue de novo e de preferência o mais depressa possível, antes que este estado «morno» de gente satisfeita e contente tudo queime até as raízes mais profundas do cristianismo na nossa sociedade. Que venham essas revoluções que e nos obriguem a tomar as decisões que por conveniência não fomos capazes de tomar. Que apareçam esses “revolucionários” que nos reduzam a menos da metade e deixem apenas «um pequeno resto» de seguidores sem medo. Seria, provavelmente, um novo começo... a Igreja seria mais humilde, menos institucional, mas mais carismática. E isso seria bom...


David

2005-02-09

Hino de inicio da Quaresma

Benigno Criador, ouvi clemente
As nossas orações e o nosso pranto;
Neste sagrado tempo da Quaresma,
Compadecido olhai-nos, ó Deus Santo.

Justíssimo juiz das nossas almas,
Vós conheceis a enfermidade humana:
Voltando para vós arrependidos,
Pedimos a vossa graça soberana.

Confessamos que somos pecadores,
Mas, em vez de castigo, perdoai-nos.
Por vosso nome santo e vossa glória,
Da nossa vil miséria libertai-nos.

Aceitai o jejum e a penitência
Que em nossa própria carne suportamos;
Por eles, as nossas almas se libertem
Dos erros e misérias que choramos.

Estas nossas humildes oferendas
Aceitai, ó Santíssima Trindade,
E levai-nos, no amor purificados,
Ao esplendor da vossa eternidade.
(Rufino Grández)

2005-02-02

A Odisseia das frequências

São dias de retiro... vive-se fechados em casa, lendo textos que já foram lidos, memorizando ideias chaves, roendo unhas e tentando prever o que há-de sair nas frequências. No silêncio de cada quarto, para cada um de nós, há uma batalha que se trava e um novo mundo que se abre. Para manter a esperança, cada dia renovamos o compromisso de lutar até ao fim e juramos que tudo faremos para descobrir aquilo que nunca ninguém descobriu.

Os dias são contados. Alguns passeios foram adiados, as conversas abreviadas e as partidas de ténis de mesa limitadas porque é preciso estar no quarto. O tempo demora a passar. Na secretária, as matérias sucedem-se como os santos numa procissão. E lá virá o dia da sentença: «mais um 16? O prof. foi generoso!».

É a odisseia das frequências. Um tempo agridoce que lenta e discretamente nos transforma em Homens mais maduros. E, confesso, acho que é um tempo com piada, pois a vida de estudante sem frequências seria de um tédio insuportável, uma aventura previsível e um desafio sem obstáculos.
David

Contemplação...

Vinha de noite
E trazia a noite
A crepitar notícias de espanto
Nesta alegria de Te reconhecer
No transbordar da vida
No umbral da contemplação
Na centelha luminosa
Que em mim ecoou:
“Tens de nascer de novo
Num tempo que não volta atrás”


João Luis Silva

2005-01-29

O Alpinista



«Contam que um alpinista, desesperado por conquistar uma altíssima montanha, iniciou a sua escalada depois de anos de preparação. Como queria a glória só para ele, resolveu subir sem companheiros.
Durante a subida, a noite caiu, mas ele não estava preparado para acampar, por isso, decidiu continuar a subir... até escurecer. A noite era muito densa naquele ponto da montanha, e não se podia ver absolutamente nada. Tudo era negro, a lua e as estrelas estavam encobertas pelas nuvens. Ao subir por um caminho estreito, a apenas poucos metros do topo, escorregou e precipitou-se pelos ares, caindo a uma velocidade vertiginosa. O Alpinista via apenas velozes manchas escuras passando por ele e sentia a terrível sensação de estar sendo sugado pela gravidade.

Continuava a cair... e nos seus angustiantes momentos, passaram pela sua mente alguns episódios felizes e outros tristes de sua vida. Pensava na proximidade da morte, sem solução...

De repente, sentiu um fortíssimo solavanco, causado pelo esticar da corda na qual estava amarrado e presa estacas cravadas na montanha. Nesse momento de silêncio e solidão, suspenso no ar, não havia nada que pudesse fazer e gritou com todas as suas forças:

MEU DEUS, AJUDA-ME !!!
De repente, uma voz grave e profunda vinda dos céus respondeu-lhe:
QUE QUERES QUE EU TE FAÇA?
Salva-me meu DEUS !!!
REALMENTE CRÊS QUE EU TE POSSO SALVAR?
Com toda certeza Senhor !!!
ENTÃO CORTA A CORDA NA QUAL ESTÁS AMARRADO...
Houve um momento de silêncio; então o homem agarrou-se ainda mais fortemente à corda...

Conta a equipe de resgate, que no outro dia encontraram o alpinista morto, congelado pelo frio, com as mãos agarradas à corda... APENAS A DOIS METROS DO CHÃO...

E tu, cortarias a corda?»


2005-01-22

Compreender a vontade de Deus...

«Quando uma pessoa morre há muita coisa que se pode dizer sobre ela mas também há algo que nunca se deve dizer...

Na noite em que o meu filho Alex morreu, uma senhora veio-nos mostrar a sua simpatia trazendo com ela 18 quiches e dizendo com tristeza "Nunca conseguirei compreender a vontade de Deus."
Eu explodi. " Ó minha senhora! Tenho a certeza que nunca irá compreender. Então a senhora pensa que foi a vontade de Deus que fez com que o meu Alex nunca tivesse substituído a porcaria do pára-brisas, ou que fez com que ele viesse em grande velocidade durante a tempestade, ou que fez com que ele bebesse umas cervejas a mais? Ou pensa então que é a vontade de Deus que não haja luzes na estrada ou que não exista protecção na curva entre a estrada e a baía de Boston?"

Não há nada que me exaspere mais do que a incapacidade de pessoas, aparentemente inteligentes, em compreenderem que Deus não anda neste mundo com o dedo no gatilho, de navalha aberta no seu punho, ou com as suas mãos nos volantes. As mortes precoces, lentas, cheias de dor, levantam questões às quais não encontramos respostas... Nunca teremos conhecimentos suficientes para podermos afirmar que tal morte foi da vontade de Deus...

A minha única consolação resta em que acredito que não foi da vontade do Pai a morte do meu Alex; que quando as ondas do mar cobriram o automóvel, o coração de Deus foi, antes dos nossos, o primeiro coração a despedaçar-se.»

Rev. William Sloan Coffin no dia do funeral de seu filho, Alex de 24 anos de idade.

2005-01-15

Imprevistos


Era um final de dia como tantos outros não fosse obrigado a mudar de trajecto no regresso a casa para visitar um amigo que estava no hospital. Já fazia muito tempo que não entrava num desses edifícios, tão úteis à sociedade, mas que evito sempre que posso.

Naquela tarde, meio apressado, vi-me forçado a inalar aquele cheiro tão característico dos hospitais à procura, entre salas e camas, do JP. Encontrei-o deitado, rodeado de máquinas, com um “ar de transe” e com uma cor de pele que não parecia ser a sua. Trocámos um olhar, um sorriso amarelo, poucas palavras e senti em mim crescer um sentimento de impotência, de algum desespero e até de revolta. O JP é ainda jovem mas, por razões que nem a ciência sabe, despede-se da vida.

No regresso a casa, nessa tarde, a imagem do JP parecia caminhar à minha frente. Talvez por isso, resolvi andar pé, em vez de apanhar o metro. Caminhava por uma rua que desconhecia totalmente, mas avançava em direcção a um pôr-de-sol que, em Lisboa, nunca tinha visto igual. E foi nesses instantes, como que hipnotizado pelo sol, nesse caminho de regresso a casa, que compreendi a inutilidade de uma vida rotineira e sem paixão... Não fosse aquela visita e a contemplação da forma como o sol se despedia, esse dia teria sido igual aos outros tantos dias do ano.

E desejei ser livre para dar mais tempo aos imprevistos que a vida me oferece. Arrependi-me de usar relógio, essa máquina opressora que me escraviza, e prometi a mim mesmo que, nessa noite, havia de queimar a agenda.
David

2005-01-05

Andante

Na vertigem do tempo
Amarrado à secura da sorte,
Como cárcere deserdado
Trazia na sede
A profana réstia
De ser coágulo andante.
Lentamente,
Aninhei-me na cisterna,
Do deserto dessa tarde,
Bamboleando a vida
Que se fez “Notícia Nova”,
Na profecia submersa
Do Teu: “Dá-me de beber”.

João Luis Silva