Quanto supus ser vitória é fumo apenas.
Fracasso, linguagem do fundo, pista de outro espaço mais exigente, difícil de entreler é tua letra.
Quando punhas tua marca em minha fronte, nunca pensei na
mensagem que trazias, mais preciosa que todos os triunfos.
Teu rosto chamejante perseguiu-me e eu não soube que era para salvar-me
Para meu bem desterraste-me para lugares recônditos, negaste-me
êxitos fáceis, cortaste-me saídas.
Era a mim que querias defender ao não me conceder brilho.
De puro amor por mim manejaste o vazio que tantas noites me fez
falar febril a uma ausente.
Para proteger-me deixaste passar outros, fizeste que uma mulher prefira alguém mais ousado, afastaste-me de ofícios suicidas.
Vieste sempre dar a cara.
Sim, teu corpo chagado, cuspido, odioso, recebeu-me na minha
mais pura forma para me entregar à nitidez do deserto.
Por loucura amaldiçoei-te, maltratei-te, blasfemei contra ti.
Tu não existes.
Foste inventando pela soberba delirante.
Quanto te devo!
Levantaste-me a um novo nível limpando-me com uma áspera
esponja, lançando-me para o meu verdadeiro campo de bata-lha,
cedendo-me as armas que o triunfo abandona.
Levaste-me pela mão à única água que me reflecte.
Por ti não conheço a angústia de representar um papel, manter-me
à força num alto, trepar com esforços próprios, discutir
por causa de hierarquias, inchar até rebentar.
Fizeste-me humilde, silencioso e rebelde.
Não te canto pelo que és, mas pelo que não me deixaste ser. Por
não me dares outra vida. Por me teres diminuído.
Ofereceste-me somente nudez.
É verdade que me ensinaste com dureza e tu mesmo trazias o cautério!,
mas também me deste a alegria de não te recear.
Obrigado por me tirares espessura em troca de uma letra grande.
Obrigado a ti, que me privaste de vaidades.
Obrigado pela riqueza a que me obrigaste.
Obrigado por me construir com meu barro a minha morada.
Obrigado por me afastares.
Obrigado.
(Rafael Cadenas)
2005-05-24
2005-05-12
A Mão no Arado
Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs de verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua
É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte
É triste no Outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gente com que
montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos do amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de Novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
a atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs de verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua
É triste ir pela vida como quem
regressa e entrar humildemente por engano pela morte
É triste no Outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gente com que
montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos do amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de Novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
a atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente
Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente
(Ruy Belo)
2005-05-08
Ascensão e Missão
Trinta e três anos após a sua descida à terra, Jesus sob aos céus e entra de novo em casa. O anjo Gabriel ao vê-lO passar surpreende-se por tão inesperada chegada. Trinta e três anos não era o tempo suficiente para Jesus cumprir com a importante tarefa de lançar os fundamentos do Reino de Deus.
«Já de volta?» disse o anjo a Jesus.
«Bem... Eu gostaria de ter ficado por mais uns tempos, mas eles condenaram-me à morte e crucificaram-me», respondeu-lhe Jesus.
«Oh! Crucificaram-te?!», disse o anjo, «então isso significa que fracassastes...»
«Não necessariamente», acrescentou Jesus. «Sabes, Eu chamei e congreguei um pequeno grupo de discípulos. Eles irão agora prosseguir a minha missão».
«E se eles falharem?» perguntou o anjo.
«Eu não pensei nisso... não tenho outros planos. Eu confio neles...»
Já pensastes nessa missão que como discípulo estás chamado a realizar?
«Já de volta?» disse o anjo a Jesus.
«Bem... Eu gostaria de ter ficado por mais uns tempos, mas eles condenaram-me à morte e crucificaram-me», respondeu-lhe Jesus.
«Oh! Crucificaram-te?!», disse o anjo, «então isso significa que fracassastes...»
«Não necessariamente», acrescentou Jesus. «Sabes, Eu chamei e congreguei um pequeno grupo de discípulos. Eles irão agora prosseguir a minha missão».
«E se eles falharem?» perguntou o anjo.
«Eu não pensei nisso... não tenho outros planos. Eu confio neles...»
Já pensastes nessa missão que como discípulo estás chamado a realizar?
(David)
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